Você provavelmente ouviu a notícia e talvez até tenha comemorado: foi aprovada a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5.000. À primeira vista, parece um cenário perfeito, onde milhões de brasileiros terão mais dinheiro no bolso no final do mês. Mas será que só existem pontos positivos nessa medida? Hoje o papo é sério e eu vou te explicar exatamente o que não te contaram sobre essa mudança. Vou dividir nossa conversa em três partes fundamentais: a necessidade real dessa medida (seria apenas populismo?), quem realmente defendia essa proposta e, o mais importante, quais são as preocupações econômicas que ninguém está te contando, mas que podem afetar o seu futuro.
A Correção de um Erro Histórico
Muita gente questiona se essa medida era realmente necessária ou se é apenas uma jogada política. Para entender isso, precisamos voltar no tempo. Em janeiro de 1995, você estaria isento do imposto de renda se ganhasse até R$ 676,70. Parece pouco hoje, mas precisamos considerar o “dragão” da inflação que corrói o poder de compra do nosso dinheiro ao longo das décadas. Se não ajustarmos esses valores pela inflação, acabamos cometendo uma injustiça brutal.
O problema é que a tabela não foi corrigida adequadamente. Hoje, antes da mudança, a tributação começava em R$ 2.428. Se pegarmos aquele valor de 1995 e corrigirmos pelo IPCA (o índice oficial de inflação) até outubro de 2025 usando a calculadora do Banco Central, o valor de isenção deveria ser de R$ 4.903. Ou seja, a nova proposta de R$ 5.000 não é um “presente” do governo, mas sim a correção de uma distorção que vinha penalizando os mais pobres há 30 anos.
Comparativo: O Empobrecimento da Faixa de Isenção
Para você visualizar o tamanho do problema que foi criado nas últimas décadas, preparei uma tabela comparando o poder de compra e a faixa de isenção em relação ao salário mínimo:
| Ano | Faixa de Isenção Nominal | Salário Mínimo da Época | Qtd. Salários Mínimos para Tributar |
|---|---|---|---|
| 1995 | R$ 676,70 | R$ 100,00 | 6,7 salários |
| 2025 (Atual) | R$ 2.428,00 | R$ 1.518,00 | 1,5 salários |
| 2025 (Corrigido IPCA) | R$ 4.903,00 | – | – |
Perceba que, em 1995, para começar a pagar imposto, você precisava ganhar quase 7 salários mínimos. Hoje, quem ganha um salário mínimo e meio já estava sendo tributado. O governo passou a tributar pessoas cada vez mais pobres simplesmente por não corrigir a tabela. Portanto, independentemente de viés político, essa correção era tecnicamente urgente.
Populismo ou Consenso?
Existe um debate acalorado sobre se essa medida seria apenas uma manobra populista do governo atual. Mas aqui vai um dado que muitos esquecem: durante as eleições de 2022, a correção da tabela de isenção para a faixa de R$ 5.000 era uma promessa de campanha de ambos os candidatos, tanto de Lula quanto de Bolsonaro. Isso indica que havia um consenso político sobre a insustentabilidade da tabela anterior. Não existe almoço grátis em economia; quando beneficiamos um grupo (os 10 milhões de isentos), alguém precisa pagar a conta para manter o equilíbrio fiscal. Se você quiser entender mais sobre as regras atuais e quem precisa declarar, vale a pena conferir nosso artigo completo sobre quem declara IRPF 2025.
Os Riscos e as Preocupações Econômicas
Agora vamos falar do que realmente preocupa o mercado e os economistas. A renúncia fiscal gerada por essa isenção cria um “buraco” na arrecadação. O governo optou por compensar isso taxando os super-ricos, especificamente quem ganha acima de R$ 50 mil por mês, focando em lucros e dividendos. A Instituição Fiscal Independente (IFI) estima que, mesmo com essa compensação, haverá um impacto negativo de cerca de R$ 1 bilhão por ano. Embora pareça muito dinheiro, para a dinâmica fiscal de um país do tamanho do Brasil, esse valor é praticamente neutro.
O Impacto no Consumo e na Inflação
Outro ponto técnico interessante é a “propensão marginal a consumir”. Veja como isso funciona na prática:
- Quem ganha R$ 50.000: Se tiver R$ 1.000 extras, provavelmente vai investir ou poupar. Essa pessoa já tem suas necessidades básicas satisfeitas.
- Quem ganha R$ 3.000: Se tiver R$ 1.000 extras (pela isenção do IR), esse dinheiro vai quase todo para o consumo imediato (comida, reforma, transporte).
Isso gera um receio de que o aumento do consumo pelas classes mais baixas possa pressionar a inflação, dificultando o trabalho do Banco Central. No entanto, barrar uma correção histórica justa por medo de pressão inflacionária seria manter uma penalização injusta sobre os mais pobres.
A Polêmica da Tributação de Dividendos
Muitos críticos afirmam categoricamente: “Se tributar dividendos, o investimento cai, o emprego some e os salários diminuem”. Eu fui atrás de evidências científicas para verificar se isso é verdade, analisando estudos de casos nos EUA, França e Suécia. O que os dados mostram é surpreendente e contraria o senso comum de muitos analistas de internet.
| País | Evento | Resultado Observado nos Estudos |
|---|---|---|
| Estados Unidos (2003) | Redução de impostos sobre dividendos | Não houve evidências de aumento no emprego, atividade econômica ou salários. |
| França (2013) | Aumento brutal de impostos sobre dividendos | Empresas distribuíram menos lucros e reinvestiram mais no negócio. Resultado: mais emprego e atividade econômica. |
| Suécia | Redução de impostos sobre dividendos | Efeito nulo no investimento total e sem mudanças significativas em salários e empregos. |
Esses estudos sugerem que a tributação de dividendos (que é diferente de tributar o lucro da empresa em si) não gera necessariamente o apocalipse econômico que muitos pregam. O maior risco real, na minha visão, não é a fuga de empresas, mas sim a “elisão fiscal”: os super-ricos, com acesso aos melhores contadores e advogados, encontrarem formas lícitas de transformar seus rendimentos para fugir dessa nova tributação, frustrando a arrecadação esperada pelo governo.
No fim das contas, a isenção do imposto de renda é uma medida de justiça fiscal atrasada. O desafio agora é monitorar se a compensação de receitas funcionará como planejado ou se teremos surpresas nas contas públicas.