dez, 2025 Investimentos

Dívida líquida/EBITDA: o que significa esse indicador?

Luiz Guilherme Aboim

A alavancagem financeira é um conceito fundamental na análise de empresas, referindo-se ao uso de dívida para financiar os seus investimentos. Ao utilizar dívida, uma empresa pode aumentar seu potencial de retorno sobre o patrimônio líquido, mas também aumenta o risco financeiro.

A análise da alavancagem financeira é essencial para entender a estrutura de capital da empresa e avaliar sua capacidade de cumprir seus compromissos financeiros e gerar retornos para os acionistas.

A alavancagem financeira é favorável quando os retornos gerados pelos ativos (ROIC, do inglês return on invested capital) superam o custo da dívida e assim, aumentam o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE – do inglês return on equity). Isso é especialmente importante em ambientes de taxa de juros mais baixas.

Dentro desse contexto, este artigo aborda um importante indicador que avalia a alavancagem financeira de uma empresa: o índice dívida financeira líquida/EBITDA. Entenda como ele funciona, em quais momentos deve ser utilizado e outros pontos importantes que você deve considerar em uma análise.

O que o indicador dívida líquida/EBITDA avalia?

O índice dívida financeira líquida/EBITDA anual é uma métrica importante para avaliar a alavancagem financeira de uma empresa, ou seja, a relação entre sua dívida financeira líquida e sua capacidade de gerar fluxo de caixa operacional (EBITDA).

Esse índice mede quanto tempo uma empresa levaria para pagar sua dívida líquida usando os recursos gerados por suas operações (EBITDA), assumindo que o EBITDA permanece constante.

Ou seja, é um índice que apresenta a relação entre a dívida financeira líquida e a capacidade de geração de caixa. Por isso, é amplamente usado por analistas e credores, cujo trabalho é avaliar a sustentabilidade financeira do negócio. É por isso, também, que essa informação vai aparecer nas análises de ativos que você encontrar por aí.

Na prática, quanto menor o resultado, mais saudável tende a ser a estrutura de capital da empresa, já que indica que ela gera caixa suficiente para honrar seus compromissos. Valores muito altos, por outro lado, podem sinalizar risco financeiro elevado, já que a empresa depende de muitos anos de resultado operacional para liquidar suas dívidas.

Como calcular dívida líquida/EBITDA

A fórmula do indicador é a seguinte:

Dívida líquida/EBITDA = dívida financeira líquida / EBITDA

Se uma empresa, por exemplo possui dívida financeira líquida de R$ 200 milhões e EBITDA anual de R$ 100 milhões, o cálculo será:

200/100 = 2

Isso significa que, mantendo o mesmo nível de geração de caixa operacional, a empresa levaria dois anos para quitar todas as suas dívidas financeiras.

Atenção: para evitar erros de cálculo e interpretações equivocadas, o ideal é que você prefira buscar essa informação diretamente nos balanços financeiros das empresas de capital aberto, ou em relatórios desenvolvidos por casas de análise confiáveis.

O que é dívida líquida?

A dívida líquida é o valor total das obrigações financeiras da empresa, subtraído do saldo de caixa e equivalentes. Ela mostra o quanto a companhia realmente deve, após descontar os recursos disponíveis para pagamento imediato.

Dessa forma, temos aqui um cálculo que traz uma visão mais realista da posição de endividamento líquida.

Uma empresa pode ter uma dívida bruta alta, por exemplo, mas ainda assim apresentar dívida líquida baixa se mantiver caixa robusto. Para quem analisa ativos, esse indicador serve principalmente para entender o grau de alavancagem financeira real da companhia.

O que é EBITDA?

O EBITDA (Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization) é uma medida de desempenho operacional que mostra o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização. Ele indica o quanto a empresa gera de resultado unicamente com suas atividades principais, sem interferência de fatores financeiros ou contábeis.

É por isso que o EBITDA é usado para comparar empresas de tamanhos e estruturas de capital diferentes – afinal, exclui itens que podem distorcer o lucro líquido. Na relação com a dívida líquida, ele representa a capacidade de geração de caixa operacional. Em termos mais simples, é um meio de mensurar o fôlego financeiro da companhia.

Existe um limite máximo para a relação dívida líquida/ EBITDA?

É comum lermos análises que sustentam um limite máximo tolerável para o índice dívida financeira líquida/ EBITDA recorrente dos últimos 12 meses está na faixa entre 2,5 e 3,5.

Além disso, a relação dívida líquida sobre EBITDA é frequentemente utilizada como um indicador financeiro em cláusulas restritivas (ou cláusulas covenants) em contratos de financiamentos – muitos contratos estabelecem um limite máximo para essa relação.

Por exemplo, um covenant pode exigir que a empresa mantenha a relação dívida financeira líquida sobre EBITDA abaixo de 2,5 vezes. Isso significa que, se a empresa ultrapassar esse limite, poderá estar em violação do contrato e sujeita a penalidades ou outras consequências, como aumento de taxas de juros, restrições adicionais ou até mesmo aceleração do vencimento da dívida.

No entanto, a conclusão sobre a saúde financeira da empresa não pode se basear simplesmente num índice.

Um limite tolerável para esse índice vai depender não apenas do setor de atividade, mas também de questões relativas à macroeconomia e outras questões específicas da empresa, destacando-se:

Risco operacional

Empresas de baixo risco operacional são pouco sensíveis aos movimentos da economia. São empresas que vendem produtos ou prestam serviços considerados essenciais. Elas podem operar de maneira sustentável com índices de alavancagem mais altos devido à natureza de seus fluxos de caixa estáveis e previsíveis

Por outro lado, existem empresas de elevado risco operacional, que devem trabalhar com índices de alavancagem mais baixos devido à maior volatilidade nos fluxos de caixa.

Ciclo de vida da empresa

Empresas em fase de crescimento podem ter índices dívida financeira líquida/EBITDA mais altos, pois investem pesado na ampliação da capacidade produtiva e tem ativos fixos que podem ser oferecidos como garantia para os bancos.

Tais empresas se alavancam em períodos de ampliação da capacidade, quando a dívida financeira aumenta acima do EBITDA. Quando os projetos de ampliação entram em operação, o EBITDA tende a crescer, permitindo o pagamento da dívida e assim, a alavancagem começa a cair.

Em contraste, empresas mais maduras que já não necessitam realizar grandes investimentos podem ter índices mais baixos.

Cenário macroeconômico

A alavancagem pode ter relação também com o cenário macroeconômico.

Durante períodos de crescimento econômico, as empresas podem sustentar níveis mais elevados de endividamento. Em tempos de baixo crescimento, e principalmente numa recessão, os investidores preferem investir em empresas com índices de alavancagem mais baixos pois se preocupam com a solvência da empresa.

Mesmo os bancos, em períodos recessivos, preferem emprestar para empresas menos alavancadas para reduzir o risco.

Como interpretar dívida líquida/EBITDA?

O índice precisa ser analisado sempre considerando o contexto em questão, ou seja, levando em conta o setor, o porte e o momento financeiro da empresa. De modo geral, a interpretação é a seguinte:

  • Abaixo de 1: endividamento muito baixo e estrutura financeira sólida;
  • Entre 1 e 3: situação saudável e administrável, comum em empresas equilibradas;
  • Entre 3 e 4: pode indicar aumento do risco e necessidade de reavaliação da dívida;
  • Acima de 4: sinal de alto endividamento e potencial dificuldade de pagamento.

Na prática, o ideal é comparar esse índice com a média do setor, para ter uma noção mais clara se a empresa está operando em um patamar de risco adequado. Além disso, é importante mesclar a dívida líquida/EBITDA com outros indicadores para uma análise mais completa de ativo.

Quais são as limitações da dívida líquida/EBITDA?

A dívida líquida/EBITDA é, de fato, um indicador bastante relevante, mas também apresenta algumas limitações que podem afetar a análise:

  • Não considera o custo da dívida: duas empresas podem ter o mesmo índice, mas com encargos financeiros muito diferentes;
  • Ignora o perfil de vencimento das dívidas: o prazo de pagamento pode alterar drasticamente o risco real;
  • Depende da consistência do EBITDA: se o EBITDA for inflado por ajustes contábeis, o indicador perde credibilidade;
  • Não reflete sazonalidade: empresas com resultados cíclicos podem apresentar variações grandes ao longo do ano;
  • Diferenças entre setores: o que é considerado “alto” ou “baixo” varia conforme o segmento, então comparações diretas tendem a ser imprecisas;

Veja só: essas limitações servem para reforçar a importância de analisar o índice em conjunto com outros indicadores de endividamento e rentabilidade. Do contrário, a interpretação sobre seus valores pode ser distorcida ou imprecisa.

Recapitulando os pontos mais importantes

O indicador Dívida Líquida/EBITDA é uma das principais métricas para medir a capacidade de pagamento de dívidas de uma empresa – vai aparecer em basicamente todas as análises de ativos que você buscar. Afinal, ele mostra quantos anos de geração de caixa operacional seriam necessários para quitar as obrigações, o que ajuda investidores e credores a avaliar o risco financeiro de determinada companhia.

No entanto, ele não deve ser analisado isoladamente. Estrutura de capital, o custo da dívida e a consistência do EBITDA são apenas alguns dos fatores extras que devem acompanhar essas análises, para que as interpretações não apresentem distorções.

Além disso, quando combinado com outros indicadores, como ROIC, ROE, margem líquida, fluxo de caixa livre e cobertura de juros, o índice consegue trazer uma visão bem completa da saúde financeira da empresa.

Perguntas frequentes sobre dívida líquida/EBITDA

Respondemos a algumas das perguntas mais frequentes sobre o indicador dívida líquida/ EBITDA para você conhecer em detalhes.

O que significa ter uma dívida líquida/EBITDA negativa?

Significa que a empresa possui mais caixa do que dívida, ou seja, está em posição líquida credora. Isso é um sinal de força financeira, comum em empresas com geração de caixa robusta ou em momentos de desalavancagem.

Quando a dívida líquida/EBITDA é considerado bom?

De modo geral, um índice entre 1 e 2 é considerado bom. Ele indica que a empresa conseguiria pagar suas dívidas com até dois anos de geração operacional, sem comprometer a expansão do negócio. No entanto, a interpretação do índice deve sempre ser feita em conjunto com outros indicadores.

Qual a dívida líquida/EBIDTA ideal?

Não existe um valor único. Cada setor possui padrões diferentes de endividamento. Em setores mais estáveis, como energia, telecomunicações, concessões de rodovias e saneamento, índices de até 3 podem ser aceitáveis. Já em setores cíclicos, como em siderúrgicas, mineração, óleo e gás, varejo não alimentar ou tecnologia, o ideal costuma ser um índice abaixo de 1,5.

Economista, especialista em valuation. Professor convidado do Coppead/UFRJ, FGV e Faculdade HUB. É sócio-fundador da ConfianceTec e da Escola de Finanças Aboim.
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